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terça-feira, 24 de janeiro de 2012

À LÁPIS, O DESENHO HEDÔNICO - Uma crônica de Jairo De Britto -


Caminho ao longo do braço esquerdo do rio que corre em meu peito, embora um lago tranqüilo se ofereça aos meus olhos insones.
Caminho pelos dias afoitos, noites insolentes, madrugadas frias que, ainda assim, me fazem transpirar em pleno silêncio. Leio, releio, escrevo, reescrevo, corto, recorto, releio - até aquém chegar daquilo que pretendo doutra forma dizer.
Sim, outras e outras e tantas formas, é o que procuro. Para que  sílabas, palavras e parágrafos não se limitem às estreitas fronteiras da comum escritura. Para invadir seus grandes olhos com todos os sons e cio de cada caro fonema.
“Escrever (não é só, como já foi dito), uma forma de falar sem ser interrompido”.
Escrever é para Viver, ou sobreviver, sabendo que tal forma de Ser não foi escolhida. É o Presente: estar e ser – um flagrante e sempre inédito estarrecer!
Secular amanuense, de ávidos e áridos tempos - quando, afogados em imagens tantas, meus olhos sucumbíam, eu distraio mulheres, homens e crianças, enquanto me entrego a lembranças d’além da infância; de outras margens dos rios e oceanos em que naveguei.
Sem esquecer de dizer que, perdido, às margens de muitas laudas, também fiquei.  
Saber que você dorme, entregue a sonhos infantes, às vezes eróticos, em nossa cama, aguça meu olfato e paladar. Ser o homem a velar seu sono, em porto seguro, suscita lembranças outras, de terras e tempos tão distantes.
Ainda que "nau à deriva", aqui, seja o mais plausível dizer.
Ainda que ao menos saiba permitir que a madrugada se estenda, como naquela tarde  de sépia e aquarelas. Até que a manhã, com seu hálito de aurora e seus hábitos de velha senhora, se imponha sem mais delongas ou quaisquer pretensas cerimônias.

Sim , como naquela em que o jovem poeta, que adormeceu no gramado do campus, e abriu os olhos. Sobre eles, outros fitos: azuis e delicados.
Diamantes, eles. Apenas comparáveis à visão seguinte, quando os meus pousei sobre o caderno da linda jovem, que havia deles roubado tudo, num silente exercício de juvenil Amor Desenhado, estendido além dos olhos; rosto afora.
Quando notou-me, surpreso e maravilhado, disse-me noutra língua:
“Algo de mais maroto e lascivo há em seu rosto. Mas adoro seus longos cílios. Veja: terminei meu trabalho anual enquanto você dormia ao meu lado. Sei que o professor vai gostar. Sei que irá para a exposição anual dos melhores...”
 A Amizade não é um sentimento. É bem definida e definitiva: é o sentimento!
E tão grande e avassalador; tão aconchegante, que deve fazer inveja ao Amor. Quando se encontram, formam a mais sublime e cúmplice orquestra a executar a carinhosa Sinfonia da Gratidão...
Tudo brotado em clara selva de piano, oboé, sax e sexo, seguida de corpos em repouso dileto.
A festa e farra dos amantes, em qualquer idade, é como a Música; como os ritmos que embalam, acalantam e embrulham meus dias e noites.
Como um infindo e sensual Lundu. Como aquele atrevido Alarido Cigano - estaiado, a sustentar enormes fogueiras com danças, canções, cores, cartas, ouro, fitas e fogo.
Tudo ao Luar Cheio – a fantasia que apascenta a soberba do mítico Dragão Chinês. Este, que em libertina tradução Ocidental, não passa (schüller) d'um “Tigre de Papel”  ! 

Jairo De Britto, em "Verdes Crônicas "
Vitória (ES), 17 de Dezembro de 2011


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